Comentários de Fernando Abelha

Mesmo com os reconhecidamente péssimos serviços prestados ao transporte ferroviário do País, a concessionária Rumo, antiga ALL, pretende renovar seu contrato com o governo por mais 30 anos.

Pasmem…tudo é possível na terra de Jó.

Se não bastasse o desrespeito contratual com o governo, o que provocou uma demanda judicial de mais de R$ 1 bilhão, o abandono de milhares de quilômetros de linhas propiciando a invasão da faixa de domínio, sucateamento do material rodante, furto de trilhos e outras mazelas, a antiga ALL deixa ainda de atender aos produtores agrários, caso confirmado no Rio Grande do Sul, no escoamento da produção de arroz em Alegrete. A RUMO para privilegiar as suas cargas próprias nega o transporte a que é obrigada contratualmente com o Ministério dos Transportes, para atender ao produtor agrário. Atualmente para esvaziar os silos são contratados dezenas de caminhões agravando, com altas tarifas, o que é aplicada, significativamente, ao custo final. O Ministério Público Federal e do Estado de Minas Gerais estão no encalço da RUMO, enquanto que a ANTT vem aplicando dezenas de multas contratuais, sem obter êxito no cumprimento do contratado.

RUMO busca renovar concessão e tem

disputa de R$ 1 bilhão com a União

 A disputa judicial entre o governo e a ALL Malha Paulista, que está em negociações avançadas para renovar por mais 30 anos seu contrato de concessão, já chega a mais de R$ 1 bilhão. De um lado, a União ficou sem receber os valores referentes às parcelas do trecho ferroviário administrado pela empresa. De outro lado, a concessionária alega que está pagando despesas que deveriam estar sendo quitadas pelo governo.

 A concessão do trecho que liga a divisa de São Paulo com Mato Grosso do Sul ao porto de Santos foi arrematada em 1998. A ALL – hoje Rumo – acabou assumindo passivos trabalhistas da extinta REDE FERROVIÁRIA FEDERAL (RFFSA). Sem saber se teria que arcar efetivamente com os custos desses processos, a concessionária conseguiu nos tribunais o direito de depositar em juízo os valores correspondentes ao arrendamento.

  De acordo com a AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES (ANTT), os depósitos judiciais referentes ao arrendamento da Malha Paulista somam atualmente R$ 1,028 bilhão – em valores corrigidos pela inflação. Os “pagamentos” estão sendo feitos por meio da apresentação de seguro-garantia. Situação parecida acontece no contrato da Malha Oeste, entre os municípios de Corumbá (MS) e Bauru (SP), onde a ALL depositou R$ 683 milhões em juízo.

  O controle acionário da ALL foi alterado em 2014, após sua fusão com a Rumo, e hoje é controlada pelo grupo Cosan. A empresa garante que houve uma mudança de postura desde a troca de comando, com menos recursos judiciais para postergar obrigações financeiras com o poder concedente.

  Nos cálculos da Rumo, esse encontro de contas ainda tem saldo favorável à empresa, que já teria dispendido mais recursos na quitação de passivos da RFFSA do que devia ao governo como valor de arrendamento. “Pelo menos até 2018, nas nossas estimativas, ainda teremos dinheiro [a receber] pelas indenizações trabalhistas que foram feitas no passado e que continuam sendo feitas, diga-se de passagem”, afirmou o presidente da Rumo, Julio Fontana.  A ALL Malha Paulista também tem levado para os tribunais boa parte das multas recebidas da agência por descumprimento de normas contratuais.

Desde sua criação, em 2001, a ANTT contabiliza 147 processos sancionatórios contra a ferrovia, mas a grande maioria sem qualquer efeito prático para punir as irregularidades verificadas pela autarquia responsável por fiscalizar o setor.

Pelo menos 78 processos foram suspensos pela Justiça, o que fez o governo recolher menos de 7% das penalidades financeiras aplicadas. Até hoje, foram arrecadados R$ 893 mil com as multas à Malha Paulista, enquanto que os processos suspensos judicialmente acumulam R$ 14,5 milhões. De acordo com a ANTT, outras 23 ações estão em fase de instrução e ainda sem uma decisão final no âmbito administrativo.

  Em uma terceira frente de judicialização, as concessionárias do grupo ALL não aplicam as tarifas revisadas pela agência em 2012, que resultaram em uma queda de 25% do teto tarifário definido para balizar os contratos de frete assinados com seus clientes. Uma liminar em vigência impede a ANTT de aplicar os novos valores. O processo tramita no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

  Um dos argumentos rotineiramente usados pela Rumo nas discussões é que a empresa carrega apenas cargas de terceiros em seus trens, ao contrário das demais concessionárias, que transportam mercadorias de seus próprios acionistas – e, portanto, são menos sensíveis ao valor das tarifas.

  Todas as pendências administrativas e judiciais da ALL Malha Paulista serão colocadas em discussão pela ANTT via uma audiência pública que deve ser instalada até o fim deste mês. O objetivo da agência é abrir um debate transparente sobre o assunto antes de levar adiante a renovação do contrato, que acaba em 2028. Uma comissão interna de servidores foi criada no fim de 2015 para tratar das prorrogações de ferrovias anunciadas no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.

  De todas as concessionárias, a ALL Malha Paulista tem o processo mais adiantado. Em troca de mais 30 anos de contrato, os novos controladores se comprometem a elevar em 150% a capacidade total de transporte da ferrovia – de 30 milhões para 75 milhões de toneladas/ano. O tempo necessário para percorrer os 820 km que separam a divisa de Mato Grosso do Sul com São Paulo até o porto de Santos cairá das atuais 59 horas para cerca de 46 horas.

 Essas intervenções vão sair do papel até 2024, segundo o caderno de obrigações protocolado pelo grupo na agência reguladora.

  Em fase final de elaboração, a medida provisória que trata de concessões com problemas financeiros também disciplina as renovações de contratos na área de infraestrutura. No caso das ferrovias, um dispositivo que constava de versão preliminar da MP assustou o mercado.

O governo exigiria, antes da prorrogação das concessões, um inventário de todos os bens móveis e imóveis das empresas. Estima-se em pelo menos um ano o tempo necessário para fazer todo esse levantamento e o dispositivo foi interpretado como um freio nos planos da ALL Malha Paulista, que encabeça os pedidos de extensão contratual.

  A última versão da MP não faz mais essa exigência, o que é benéfico para as operadoras de ferrovias e, em especial, para o grupo controlado pela Cosan.

Fonte:  Valor Econômico