Comentários de Fernando Abelha

Edição de Luis Fernando Salles

No decorrer do ano de 2011, a Associação dos Engenheiros Ferroviários – AENFER, à época presidida pelo engenheiro Luiz Lourenço, juntamente com a Associação Mútua Auxiliadora da dos Empregados da Estrada de Ferro Leopoldina, presidida pelo ferroviário Raimundo Neves e da Associação de Preservação Ferroviária, presidida pelo professor Vitor José Ferreira, desenvolveram trabalho em defesa da Estação Barão de Mauá, terminal e sede administrativa no RJ da Estrada de Ferro Leopoldina.

Como tudo ou mais em nosso país que não envolva o interesse pessoal é renegado a um segundo plano, esta denúncia até os dias atuais em nada prosperou.

Abaixo, transcrevemos carta do presidente

Foto Mútua - 1

Raimundo Neves presenteia em 2015 o deputado estadual Carlos Osório com a placa “Amigo do Ferroviário”, em agradecimento ao seu empenho em favor da recuperação da Estação Barão de Mauá, quando Secretário de Transportes do Estado do Rio de Janeiro

 

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Ofício nº 093/ 11

                                                                                             Rio de Janeiro 14 de outubro de 2011

À Egrégia

7ª. Promotoria do Ministério Público Estadual

Rio de Janeiro -RJ

Assunto: Favorecimento de empresa em obra do TAV – Trem de Alta Velocidade/ Informações

Senhores Promotores,

                A Associação Mútua Auxiliadora dos Empregados da Estrada de Ferro Leopoldina, a mais antiga entidade classista ferroviária do País, fez-se ciente pelo boletim eletrônico editado pela Revista Ferroviária (cópia anexa), que essa egrégia Promotoria instaurou inquérito civil público para investigar se o Governador Sérgio Cabral favoreceu a empresa Odebrecht, concedendo-lhe gratuitamente a exploração comercial de próprios públicos – edifício da Estação Barão de Mauá / Leopoldina e área a ela adjacente, até o ano de 2048.

                Cumprimento a Exma. Deputada Janira Rocha pela iniciativa da representação que, acolhida por Vossas Excelências, deu origem ao inquérito citado, e na condição de interessada na preservação do patrimônio histórico e cultural ferroviário, patrimônio do povo brasileiro, esta Associação se permite transmitir-lhes informação e cópias de documentos que, ao nosso ver, poderão subsidiar o referido inquérito, a saber:

  1. A Estação Barão de Mauá, sede da antiga Estrada de Ferro Leopoldina, possui relevante valor histórico, sendo tombada pelo INEPAC – Instituto Estadual do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro;
  2. Trata-se de imóvel pertencente à Extinta Rede Ferroviária Federal S/A – RFFSA, conforme registros cartoriais competentes (cópia anexa). Com a extinção da citada empresa, a Estação foi entregue à Superintendência do Patrimônio da União – SPU no Rio de Janeiro – SPU/RJ, com visitas à sua posterior destinação ao IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, face à sua relevância para a preservação da memória ferroviária, tudo de conformidade com a Lei Federal nº 11.483, de 31/ 05/ 2007, e o Decreto nº 6.769, de 10/02/2009, do Exmo. Sr. Presidente da República (cópias anexas);
  3. Anteriormente, quando foi criada a Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU, mediante cisão da RFFSA e como subsidiária desta, a citada empresa destinou à nova Companhia 50% (cinquenta por cento) da posse ( não da propriedade) do complexo da , a Flumitrens cedeu a posse de 50% Superintendência de Trens Urbanos do Rio de Janeiro -STU / RJ, unidade operacional da CBTU, esta transferiu aquela parcela de posse e uso do complexo para a Flumitrens – Cia. Ee Trens Urbanos do Estado do Rio de Janeiro. Passo seguinte, com privatização dos serviços de trens de subúrbios do Rio de Janeiro, a Flumitrens cedeu a posse de 50% que recebera da CBTU para a Supervia, empresa privada que se tornou concessionária dos referidos serviços:
  4. Algum tempo após, a Supervia, por sua decisão e conveniências empresariais, deixou de operar na Estação Barão de Mauá e, por resolução da AGETRANSP, agência reguladora dos serviços concedidos de transporte no Estado do Rio de Janeiro, teve que devolver a posse da parceria em questão ao Governo do Estado (cópia de Resolução anexa)
  5. Eis que recentemente, ao firmar um “ Termo de Transação” (cópia também anexa) com a Supervia, prorrogando o contrato de concessão, o Governo do Estado arbitrariamente, sem considerar as razões que conduziram à resolução da AGETRANSP e que continuam vigentes, voltou a entregar a Estação e sua área adjacente à dita concessionária, agora sob o controle do Grupo Odebrecht;
  6. Mais ainda, o Governo do Estado, em Aditivo ao citado “Termo de Transação” igualmente anexado em cópia entregou também gratuitamente à concessionária diversos outros imóveis não operacionais ao longo da malha ferroviária concedida; como tais imóveis não se destinam à operação ferroviária, depreende-se que serão eles utilizados pela Supervia / Odebrecht à exploração imobiliária, com os consequentes ganhos financeiros.
  7. Tal decisão do Governo do Estado, favorecendo um grupo empresarial em detrimento do Poder Público, ademais de ir de encontro às razões que fundamentaram a decisão da Agência Reguladora, ignorou também a União Federa, que dentem a propriedade do imóvel e a posse de 50% do mesmo, mas que se omitiu em todo o processo, deixando de exercitar o dever de zelar por um patrimônio público a ela veiculado e impedir sua graciosa entrega a um grupo empresarial privado, assim favorecendo para ele auferir ganhos com exploração imobiliária;
  8. Cabe ainda mencionar que, segundo notícias publicadas em jornais, a empresa Odebrecht é interessada na operação / construção do Trem de Alta Velocidade – TAV, inicial do Estado do Rio de Janeiro, o que representará favorecimento injustificável, frente aos demais licitantes.

Há que se considerar, ainda, Senhores Promotores, os fatos seguintes:

  1. O Ministério dos Transporte elaborou projeto para instalar na Estação Barão de Mauá e parte de sua área adjacente o Museu Ferroviário Nacional;
  2. A criação do Museu Ferroviário Nacional é já objeto do Projeto de Lei nº 173, de 09/ 06/2010, de autoria do então Senador Paulo Duque, em trâmite no Senado Federal;
  3. Todos os estudos para a implantação do TAV – Trem de Alta Velocidade, popularmente conhecido como “Trem Bala”, indicam a citada Estação como seu terminal de partida / chegada no Rio de Janeiro e o terreno que lhe é adjacente como retroárea de apoio logístico operacional ao trem – oficinas, almoxarifados, abrigos etc;
  4. O projeto de reativação da Estrada de Ferro Príncipe do Grão – Pará (reativação da ligação ferroviária entre Rio de Janeiro e Petrópolis), considerado de relevante interesse pela Lei Estadual nº 5.791 / 2010, sancionada pelo próprio Governador Sérgio Cabral.

Face a tudo o que foi exposto, Senhores Promotores, esta Associação entende que o Governo do Estado do Rio de Janeiro afrontou disposições legais, o interesse público e os direitos da União Federal, dispondo, a seu bem prazer e benevolentemente para a iniciativa privada, de um imóvel do qual não é detentor da propriedade mas tão somente da posse de uma parcela equivalente a 50% do mesmo, destinada desde sua origem a operação ferroviária; assim, se não mais a utiliza operacionalmente, o Governo do Estado, ao invés de cede-lo gratuitamente para o grupo empresarial Supervia / Odebrecht, que também não o usará para operação ferroviária, deveria devolver a sua parcela de posse à União Federal, legítima detentora da propriedade do imóvel.

       Considerando que a permanência dessa cessão, eivada de irregularidades e afrontastes aos princípios éticos que devem reger a gestão da coisa pública, poderá gerar prejuízos irreparáveis para um patrimônio que é do povo, est Associação, ao tempo em que transmite a essa douta Promotoria as presentes informações e cópias de documentos anexos, permite-se pleitear as Vossas Excelências que malsinada transação seja de imediata tornada sem eficácia e o imóvel tenha sua posse integral retornada à União Federal, sua legítima proprietária, por meio da Superintendência do Patrimônio da União no Rio de Janeiro _ SPU / RJ.

Colocando-nos a disposição dessa douta Promotoria para informações e esclarecimentos complementares porventura julgados necessários, subscrevemo-nos.

Ass Raimundo Mútua