Comentários de Fernando Abelha

Este blog, voltado à defesa das ferrovias e dos ferroviários, tem inserido, continuadamente, matérias referentes ao descalabro que se encontram as nossas ferrovias, após as concessões à iniciativa privada. Relatório da Procuradoria Geral da República, 3ª Câmara de Coordenação e Revisão, enviado ao Tribunal de Contas da União – TCU, em junho de 2011, obtido através da internet, relata, sobremaneira, as condições técnicas, operacionais, comerciais, preservacionistas e econômicas da América Latina Logística S/A – ALL, hoje denominada Rumo Logística. A partir deste domingo e nos demais, iremos publicá – lo parceladamente.

Segue a décima primeira parte:

Selo

Procuradoria Geral da República
3ª Câmara de Coordenação e Revisão
Consumidor e Ordem Econômica
Em defesa do Estado de Direito econômico

…6.5. Bauru/SP

O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública com pedido de tutela liminar em face de ALL HOLDING, ALL – MALHA PAULISTA S.A. (antiga FERROVIAS BANDEIRANTES SA. – FERROBAN), ALL – MALHA OESTE S.A.(antiga FERROVIAS NOVOESTE SA.), DNIT, ANTT, IPHAN, UNIÃO.

A referida ação busca a proteção dos bens oriundos da extinta Rede Ferroviária Federal S/A – RFFSA, localizados no município de Bauru/SP, dotados de valor histórico e cultural. A tutela pretendida visa proteger o patrimônio histórico e cultural, em virtude dos bens ferroviários existentes naquela localidade, assim como do patrimônio público.

No Inquérito Civil Público nº 1.34.003.000307/2008-11, que dá substrato à noticiada ação, mais uma vez, em outro local do Brasil, expõe-se o abandono de bens públicos, móveis e imóveis, dotados de valor histórico e cultural, arrendados à concessionária para exploração do transporte ferroviário. O sucateamento é potencializado pela inércia do poder público, responsável pela fiscalização e acompanhamento dos contratos de concessão e arrendamentos dos bens.

O descaso e a negligência das partes responsáveis pela conservação dos bens e pela fiscalização do correto cumprimento dos contratos de concessão e arrendamento exigiu que o MPF/SP, em atendimento a suas funções institucionais, ingressasse em Juízo buscando a tutela dos bens em questão, cobrando das partes envolvidas que assumam suas atribuições e responsabilidades com a coisa pública, consoante se pode verificar, em detalhas, na inicial em anexo.

7. A ausência de fiscalização pela ANTT:

É missão institucional da ANTT assegurar aos usuários a adequada prestação de serviços de transporte terrestre e exploração de infraestrutura rodoviária e ferroviária outorgada.

Aliás, tal premissa genérica foi instituída com a publicação da Lei nº 10.233/2001, que reestruturou os transportes aquaviários e terrestres, criando o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ – e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT.

Nessa senda, no que se refere às atribuições específicas quanto ao
transporte ferroviário, a norma legal assim dispõe:

Art. 25. Cabe à ANTT, como atribuições específicas pertinentes ao Transporte Ferroviário:

I – publicar os editais, julgar as licitações e celebrar os contratos de concessão para prestação de serviços de transporte ferroviário, permitindo-se sua vinculação com contratos de arrendamento de ativos operacionais;

II – administrar os contratos de concessão e arrendamento de ferrovias celebrados até a vigência desta Lei, em consonância com o inciso VI do art. 24;
(…)

IV – fiscalizar diretamente, com o apoio de suas unidades regionais, ou por meio de convênios de cooperação, o cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados;
V – regular e coordenar a atuação dos concessionários, assegurando neutralidade com relação aos interesses dos usuários, orientando e disciplinando o tráfego mútuo e o direito de passagem de trens de passageiros e cargas e arbitrando as questões não resolvidas pelas partes;

(…)

VII – contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória das ferrovias, em cooperação com as instituições associadas à cultura nacional, orientando e estimulando a participação dos concessionários do setor. Parágrafo único. No cumprimento do disposto no inciso V, a ANTT estimulará a formação de associações de usuários, no âmbito de cada
concessão ferroviária, para a defesa de interesses relativos aos serviços prestados.

Desse modo, a ANTT é responsável, além de outras determinações, pela fiscalização direta do cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados (inc. IV), além de contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória das ferrovias, orientando e estimulando a participação dos concessionários do setor (inc. VII).

E disso não se tem desincumbido o ente regulador.

Dispõe o art. 77 da Resolução nº 3.192/2009 que aprovou o Regimento Interno e a Estrutura Organizacional da ANTT, que cabe à Gerência de Fiscalização, vinculada à Superintendência de Fiscalização, como atividade central “(…) fiscalizar as áreas sob a responsabilidade da Superintendência, emitindo os respectivos Autos de Infração – AI”.

Frise-se que anteriormente à alteração proporcionada pela Resolução nº 3.192/2009, a responsabilidade pela aplicação das penalidades de multa e advertência era da Superintendência Serviços de Transporte de Carga – SUCAR (Resolução nº 001/2002).

A responsabilidade é da Diretoria, sobretudo do Diretor-Geral a quem cabe a representação da ANTT e o comando hierárquico sobre pessoal e serviços (art. 26, da Resolução nº 001/2002).

É visível a postura leniente da direção da Agência, que tem evitado a aplicação de qualquer penalidade à América Latina Logística S/A. O trabalho de seus próprios administrados é dificultado. Assim, infringem claramente as Resoluções que tratam especificamente do Auto de Infração.

O art. 21 do regulamento anexo à Resolução nº 442/2004 dispõe que “O auto de infração será lavrado no momento em que verificada a prática da infração, seja em flagrante seja no curso de procedimento de fiscalização” (grifou-se), e prevê a seguinte exceção: “Salvo motivo de força maior, devidamente justificado, nos casos de flagrante e de fiscalização, o auto de infração será lavrado no local em que verificada a falta, ainda que o infrator não seja estabelecido ou domiciliado no local” (§ 1º, art. 21), bem como que o Autor de Infração (AI) deverá obedecer os modelos aprovados pelas Superintendências de Processos organizacionais competentes, sendo numerado e lavrado com observância da sequência numérica do talonário (art. 22).

Ou seja, a regra é de que o agente fiscalizador deverá lavrar o Auto de Infração no momento em que constatar a prática infratora, e a exceção se refere à possibilidade de o fazer em momento posterior, desde que devidamente justificada…

Continua no próximo domingo…