Escrito por Bruno Teles

 

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Ferrovia bioceânica insana de 4.500 km liga Fiol e Ferrovia Norte Sul na ferrovia bioceânica Brasil Peru até porto no Peru, encurtando a rota Brasil Ásia.

Planejada por Brasil, China e Peru, a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km ligaria Fiol, Norte Sul e corredores de grãos do Centro-Oeste aos Andes e a um porto chinês no Pacífico, encurtando dias de viagem até a Ásia com estudos de viabilidade em 2025 e nenhuma obra iniciada ainda

Em dezembro de 2024, quando o canal Construction Time detalhou pela primeira vez o traçado da chamada ferrovia bioceânica Brasil Peru, o projeto ainda soava como linha distante desenhada no mapa. De lá para cá, a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km entrou em uma fase mais técnica, com Brasil, China e Peru alinhando estudos de viabilidade e cenários de custo ao longo de 2025, ainda sem canteiros abertos no território brasileiro.

No começo de 2025, o corredor saiu do discurso genérico e passou para um programa formal de estudos com memorando de entendimento firmado entre o governo brasileiro, instituições chinesas de planejamento ferroviário e representantes peruanos. O foco é medir, com números e mapas na mesa, se uma ferrovia contínua ligando o Atlântico na Bahia ao porto de Shankai no Pacífico faz sentido econômico, ambiental e técnico antes de qualquer trilho ser encomendado.

Do fio de aço no mapa ao corredor que cruza dois oceanos

A imagem central do projeto é a de um fio de aço atravessando a América do Sul. Esse fio começa na região de Ilhéus, na Bahia, onde a Ferrovia de Integração Oeste Leste Fiol se conecta ao futuro porto em águas profundas no Atlântico.

A partir dali, o traçado preliminar da ferrovia bioceânica insana de 4.500 km avança pelo oeste baiano, cruza o Cerrado em Goiás e encontra a Ferrovia Norte Sul, eixo longitudinal da malha brasileira.

Da ligação com a Norte Sul, o corredor segue em direção ao coração agrícola do Mato Grosso, na região de Lucas do Rio Verde, área que hoje depende de longos percursos rodoviários até portos do Atlântico.

Depois, a linha potencial sobe rumo a Rondônia e Acre, aproximando-se da fronteira com o Peru.

Do lado peruano, a proposta é que os trilhos atravessem a borda oriental da cordilheira dos Andes e desçam até o porto de Shankai, no Pacífico, financiado com capital chinês e preparado para receber navios de grande calado.

O que muda na rota de grãos e minério entre Brasil e Ásia

A motivação central do projeto está na logística de exportação. Hoje, grande parte da soja, milho, carne e minério brasileiros sai por portos no Atlântico, como Santos, Paranaguá, Itaqui ou pelo Arco Norte, seguindo para a Ásia via Canal do Panamá ou contornos longos pelo sul da África.

Cada dia extra de viagem representa custo, risco e volatilidade na cadeia de abastecimento global.

Com a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km, a ideia é embarcar grãos e minério diretamente em um porto no Pacífico, encurtando a distância até a China e outros mercados asiáticos.

Ao integrar Fiol, Fico, Norte Sul e os corredores rodoviários BR-364 e BR-317, o corredor bioceânico funcionaria como uma espinha dorsal ligando fazendas, minas, terminais intermodais e portos em uma mesma linha de escoamento, diminuindo a dependência de caminhões em rotas longas e congestionadas.

Escala do projeto: quando três Fiol cabem na mesma linha

Em termos de extensão, o projeto joga em outra categoria.

Somando o trecho brasileiro ligado a Fiol, Fico, Norte Sul e a travessia andina até o Pacífico, os estudos falam em algo entre 4.400 e 4.500 quilômetros de ferrovia integrada.

Na prática, é como ligar em sequência três linhas do porte da Fiol em um único corredor contínuo do Atlântico ao Pacífico, algo próximo à distância entre Lisboa e Moscou colocada em trilhos.

Para comparação, a Fiol tem cerca de 1.527 quilômetros planejados, a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste Fico supera os 1.000 quilômetros em seus principais trechos e a Ferrovia Norte Sul soma aproximadamente 2.184 quilômetros cortando o país de norte a sul.

Até mesmo um projeto polêmico e grande como o Ferrogrão, com cerca de 900 quilômetros, parece compacto quando colocado ao lado da ferrovia bioceânica insana de 4.500 km.

Desafio geográfico: Amazônia, rios caudalosos e a parede dos Andes

Do interior do Mato Grosso até a fronteira com o Peru, o traçado potencial atravessa áreas de relevo variado, trechos de floresta amazônica, rios volumosos e, na etapa final, a rampa íngreme dos Andes.

Para uma ferrovia de carga pesada, não basta ligar pontos no mapa com uma linha reta, é preciso respeitar limites de inclinação, raios de curva, estabilidade do solo e riscos de escorregamento.

Isso empurra o projeto para um pacote robusto de túneis, viadutos altos, galerias em meia encosta e obras de contenção de encostas.

Nas áreas mais planas do Centro-Oeste, o foco técnico recairia sobre grandes cortes e aterros, plataforma ferroviária estável e drenagem eficiente.

Já na transição para a Amazônia ocidental e na subida dos Andes, o desenho muda de patamar, exigindo soluções de engenharia típicas de ferrovias de montanha, com monitoramento constante de chuva, encostas e movimentação de taludes.

Licenciamento ambiental, povos tradicionais e complexidade social

Outro eixo crítico é o licenciamento ambiental e social.

O corredor previsto passa por biomas sensíveis, áreas de preservação e territórios de comunidades tradicionais e povos indígenas, tanto no Brasil quanto no Peru.

Isso significa licenciamento de alta complexidade, com consultas prévias, contrapartidas e eventuais revisões de traçado para evitar zonas mais vulneráveis.

Qualquer falha nessa frente pode resultar em anos de atraso, judicialização em múltiplas instâncias e aumento significativo de custos.

Programas de compensação ambiental, proteção de nascentes, corredores de fauna e garantias de que a ferrovia não isolará comunidades inteiras fazem parte do pacote de riscos que precisa ser calculado desde a fase de estudo, e não apenas quando as máquinas chegarem ao campo.

Bilhões de reais, segurança jurídica e o teste da viabilidade econômica

Uma ferrovia dessa escala exige investimentos na casa de dezenas de bilhões de reais ao longo de vários anos. Para fechar a conta, não basta uma aposta genérica no crescimento do agronegócio.

É preciso comprovar volume de carga de longo prazo, regras claras de concessão, segurança jurídica e um equilíbrio sensível entre capital público, privado e estrangeiro.

Sem esse arcabouço, o risco é a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km ficar presa como conjunto de estudos bem feitos, mas sem capacidade de virar leilão ou contrato de concessão.

A discussão envolve como dividir receitas de tarifa, quem assume riscos de câmbio e demanda, quais garantias soberanas serão aceitas e como evitar que trechos economicamente fracos inviabilizem o corredor inteiro.

Padrão técnico, bitola e integração com a malha existente

Do ponto de vista de engenharia, a tendência é adotar bitola larga e parâmetros compatíveis com Fiol e Fico permitindo composições longas e pesadas com boa velocidade comercial.

Nas regiões planas, isso significa priorizar curvas amplas, rampas suaves, plataforma com boa drenagem e obras de arte especiais para atravessar rios e áreas de várzea sem criar pontos crônicos de manutenção.

À medida que o traçado se aproxima das áreas de relevo acidentado, principalmente na transição para a Amazônia e na subida dos Andes, entram em cena pacotes mais intensos de túneis, viadutos elevados e pátios intermediários para cruzamento de trens.

Em toda a espinha dorsal, a operação dependeria de sistemas modernos de sinalização, centros de controle operacional e terminais intermodais para fazer a interface entre trem, caminhão, hidrovias e o porto de Shankai no Pacífico.

Impactos potenciais para cidades do interior e novos polos logísticos

Se sair do papel, a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km não muda apenas o caminho da soja e do minério.

Ao criar novos nós logísticos no interior do continente, o corredor tende a transformar entroncamentos rodoviários em polos de armazenamento, processamento e serviços, com pátios ferroviários, armazéns e centros de distribuição.

Cidades hoje vistas apenas como pontos de passagem de caminhões podem ganhar terminais intermodais, clusters industriais e empregos ligados à operação ferroviária, manutenção de equipamentos e serviços logísticos.

Na prática, o corredor funcionaria como eixo integrador entre lavouras, minas, fábricas e portos, redistribuindo fluxos econômicos que hoje se concentram em poucos portos do Atlântico.

Entre memorandos e trilhos reais: o que falta acontecer

A atualização de 2025 mostra um projeto que ainda não virou obra, mas que deixou de ser apenas discurso político e passou a se apoiar em memorandos formais, instituições responsáveis e análise de riscos estruturada.

O degrau seguinte é transformar esses estudos em projeto executivo, modelagem de concessão e, por fim, edital capaz de atrair grupos com capital e apetite para entregar um corredor dessa escala.

Até que isso aconteça, a ferrovia bioceânica insana de 4.500 km permanece como aposta de alto custo, alto risco e alto impacto, que só pode virar trilho real com um processo longo e tecnicamente robusto.

Diante desse cenário, na sua opinião vale a pena o Brasil assumir o esforço de uma ferrovia desse porte ou o risco ambiental e financeiro supera os possíveis ganhos logísticos na rota para a Ásia?