“Ai daqueles que enxergam.

Serão culpados por terem visto

tão pouco”

(Platão)

Texto do professor Wallace de Souza Vieira

Li emocionado, na mídia, a cessão da quase centenária Estação Barão de

Mauá, da extinta Estrada de Ferro Leopoldina à Prefeitura da cidade, com

o objetivo de tirá-la das sombras, restaurá-la e iluminá-la para a nova

vida.

Essa notícia cobre os ferroviários da saudosa Estrada de Ferro de

incontida alegria, sobretudo pelo seu profundo sentimento de

pertencimento e, ainda, pela reconhecida importância sócio-econômica do

trem e sua decorrente participação no progresso do Estado e das vidas de

qual: ferroviários e ferroviaristas.

Barão de Mauá é uma imorredoura saudade do trem na vida dos

ferroviários e, por isso, habita o inconsciente coletivo da classe.

Por sua vez, particularmente, guardo emocionado, um baú de memórias

do trem.

Tenho suas lembranças, desde menino, entranhadas no meu patrimônio

genético. Até hoje rolam vivos no meu inconsciente o som do resfolegar e

do apito do trem anunciando à minha cidadezinha, a chegada das boas

novas.

No entanto, os projetos em discussão destinados àquele ente tão querido

à Categoria, conforme informação da mídia, são excludentes em relação à

memória e à cultura do trem, quando há um rico e histórico acervo a ser

preservado.

Cito, à guisa de ilustração, o Museu do Trem, desaparecido nas entranhas

do “Engenhão” e, por decorrência, desconhecido e à margem de visitação

dos interessados, além de fonte de estudos e pesquisas acadêmicas e

corporativas de pertinência. Destaca-se, ainda, no referido Museu, a

baronesa – primeira locomotiva que circulou no Brasil, em 1854 -; os

carros de passageiros que transportavam a Família Real; o carro de

passageiro fabricado em 1912, para servir ao Rei Leopoldo da Bélgica,

quando de sua visita ao país.

A memória do trem, a pouco e pouco vai se apagando e atividades

estranhas ao universo ferroviário como estações rodoviárias, duvidosos

centros culturais – nunca associados ao trem -, praças desportivas etc,

vão ocupando espaços sobre antigas estações, oficinas, vias e outros, à

semelhança da colonização espanhola, sobretudo no México, quando

Cortez sobrepôs aos templos sagrados de astecas, mistecas, zapotecas,

maias etc. igrejas, soterrando suas crenças, ritos e mitos, culturas,

valores, ideias etc. Cruel.

Posto isto, que este “grito de dor” seja ouvido e conclame à luta

participantes e apoiadores do MPF – Movimento de Preservação

Ferroviária e outros órgãos interessados, confiantes na sensibilidade e

escuta do Digníssimo Prefeito da Cidade, Senhor Eduardo Paes, conforme

sua permanente ação destinada a trazer à luz a rica memória da cidade,

escondida nos seus logradouros, praças, ruas e vielas.

Excelentíssimo Senhor Prefeito, Barão de Mauá é a morada do Museu do

Trem – lugar sagrado e cultuado pelos ferroviários – onde há cento e

setenta anos o trem nasceu, engatinhou e cresceu no país e, por isso,

carrega um grande peso histórico.

Wallace de S. Vieira

Ferroviário-Raiz

Rio, março/2024Rio, março/2024