Crônica de Fernando João Abelha

Historicamente 30 de setembro sempre foi comemorado por esta brava classe como o seu dia: O Dia dos Ferroviários… Lembramo-nos bem: reuniões nas sedes sindicais; desfile de alunos nas escolas profissionais mantidas pelo convênio RFFSA/SENAI. Por todo o Brasil, onde as linhas férreas cortavam planícies, venciam montanhas, atravessavam os centros urbanos e delineavam as praças das estações, atraindo os bisbilhoteiros que aguardavam o retorno das composições, para especular dos que haviam partido na busca de novas plagas, e chegavam com as novidades mais recentes dos grandes centros urbanos.

 Esta mesma pintura das páginas da vida do ferroviário, se delineava traçada pela felicidade e honra de servir na ferrovia. Classe prestigiada pela importância de seus valores, quanto à seriedade e o amor pelo que faziam ao conduzir o imponente e fascinante trem de ferro, repleto de magias, transportando pessoas e cargas. O agente de estação regional detinha prestígio igual ou maior que o gerente do Banco do Brasil. Através deste  ferroviário eram programados os vagões pelos quais o produtor do então Brasil agrário, transportava ao grande centro a sua colheita, ao mesmo tempo em que verdadeiras esteiras rolantes, formadas pelos vagões ferroviários, transferiam e ainda demandam o minério de ferro das montanhas mineiras, para atravessar o Atlântico com destino além mar. O telégrafo operado nas estações, presenteava os habitantes, em milhares de cidades interioranas, com a comunicação familiar ou comercial que somente através do tic e tic, em épocas remotas, era possível vencer os espaços em tempo recorde e levar as notícias de felicidade ou tristeza aos que se distanciaram das suas origens.

Das composições tracionadas pelas máquinas vaporentas, surge a tração diesel, enquanto que nas metrópoles e megalópoles, o elétrico dominava abarrotado de trabalhadores, no seu ir e vir. Tudo era uma realidade charmosa que marcava a vida de cada um de nós brasileiros. Certa ocasião, registramos no hause organ da saudosa Estrada de Ferro Leopoldina, nossa origem ferroviária, a expressão “ser ferroviário é um estado de espírito” pronunciada pelo seu diretor-superintendente, engenheiro Paulo Flores de Aguiar, que já não está entre nós. Assim ressaltou no decorrer de sua saudação, em comemoração do Dia do Ferroviário.

Hoje, neste triste e melancólico crepúsculo da ferrovia em nosso país, lembramo-nos dos singulares momentos que trilhamos por 38 anos de trabalho, marcados na agitada função de relações públicas e assessor de imprensa, sempre marcada pelo fantástico orgulho pessoal de ser ferroviário.

Ainda hoje, após o extermínio da RFFSA, os ferroviários proscritos pelos perversos carrascos que dominam a administração do País, notadamente no segmento dos transportes; jogados que fomos a uma empresa de construção civil, uma tal de VALEC, onde, ainda cerca de 300 companheiros   resistem às perseguições e desmandos. Na realidade, se assim houvesse dignidade e respeito a uma classe que contribuiu, sobremaneira, por mais de um século, ao desenvolvimento da Nação, estas três centenas de abnegados, técnicos e trabalhadores, deveriam estar servindo na CBTU, modal ferroviário que surgiu como segmento da então RFFSA, para o transporte urbano. Portanto, está tudo errado. Registre-se, ainda, que mais de 70 mil aposentados e pensionistas, acima dos 70 anos, com salários médios em torno de R$ 1.500,00, congelados por dois anos e meio pôr esta tal de VALEC, estão a mercê do Ministério do Planejamento, quando atingem o direito à aposentadoria. Ministério onde o cinismo e a má vontade imperam no cumprimento das leis que concederam o direito à complementação dos salários com os servidores em atividade. A gestão destes aposentados e pensionistas deveria se desenvolver pelo Ministério dos Transportes, seu segmento de origem.

Para finalizar não podemos deixar de registrar neste Melancólico Dia dos Ferroviários, o nosso protesto e revolta com o que fizeram aos mais de 16 mil quilômetros de linhas concedidas à inciativa privada, abandonados à própria sorte como verdadeiro crime de lesa à pátria.